segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Rejeição de plumas

Ele voou altaneiro até o imenso azulado,
e ao tocá-lo, abriu-lhe fenda amarga.
O pleno descrido cerrou olho marejado,
que o imergiu em escuridão que tudo apaga.

Foram-lhe negados flechas e arco
assim que descendeu em chão descrido,
com as asas a se fecharem e fenecerem pelo charco
no qual lamentava permanecer fraco e inibido.

Enluto envolto por celestes cacos,
mirou seus dedos feridos por pendor;
tremebundo irritadiço, via reflexos opacos
da sua morada alta, jaz sem cor.

Recordou-se do antes
em que acendia a chama
no sentimento, que de passante
seria mais um que ama.

A sua querência diversa por mulher
encheu-lhe o peito de estranheza,
já que bem a queria, não uma qualquer
de gozo contente em única beleza.

Ao perecer da pluma derradeira,
pouco restou a duvidar.
O réprobo cupido aceitou à sua maneira
deveras ser moço para com a paixão lidar.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Descaso

Ninguém sabe precisar quando ele se retirou do minúsculo sobrado fechando com força o portão de metal enferrujado e, com facilidade descuidada, extraiu de si a lembrança da importância de saber aonde ir e para onde voltar. Era de manhã, nublada manhã de ventos confusos que o guiavam por dobras de esquinas finas feitas sem precisão e criação anônima. Precisava-se, de pronto, lembrar-se de se esquecer de quem fora um dia, quando enganara pela fala qualquer um que se aproximasse, mesmo se rijo, se nobre, se tolo ou se falastrão, pois o tempo lhe era soberbo no decorrer de suas falácias. Era um pedante. Teve contas robustas, lares sem dono, fogosas mulheres e até ao pecado convenceu ter para si. A astúcia, única “amiga protetora”, foi-lhe pobre nas poucas vezes em que perdeu e que não soube lidar, momentos funestos nos quais caía descrido dos porquês infundados embriagados de doze anos com gelo consequentes de despertares langorosos por esquecerem de lhe avisar que devia mesmo o que não tinha; deveu até as suas possibilidades, fazendo-se homem insone. No beiral de uma calçada qualquer ele matutava o plano diário, já que seu pensar vago tinha um futuro demasiado próximo, que é o restante além do guaiar rotineiro desde que lançou-se ao abandono maltrapilho. Uma vez mais amanhecido à porta de um bar, toma café e não paga a conta, põe na conta do Zé, mas o Zé não tem conta, então se apronta e em silêncio se vai sem esperar por nova graça a favor. Cada cochilo desconfortável em chão frio debaixo de marquises apáticas soava como castigo matutino por mentir para si. A solidez do seu olhar se desfez em tarde desditosa assim que o vi e percebi ser tarde para lhe estender a mão; não por falta da minha vontade, mas da sua aceitação.