sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Zodíaco


Seu dedo esticado apontava vislumbrado para as estrelas coladas naquele véu escuro que cobria o céu além do muro no qual se sentava todas as noites. Ela delineava tranquila um sem número de constelações utilizando apenas os olhos, e formava vários desenhos unindo os pontos cintilantes com traços entre eles - pontos por demais pequeninos, traços assaz finos -, preenchendo o firmamento com pinturas luminosas. Um quadro pulcro. 
Suas paixões partiam no pé diurno e retornavam no pé noturno pela alegria da ida do dia em fins de tarde com ares de missão cumprida. 
Seu vislumbre se avolumava vez por vez, ao ponto de desejar ter para si as luzes mais atraentes e guardá-las nos bolsos. 
Foi num sonho (o mais belo) em que conseguia voar e tocar com as mãos os elevados pontos brilhantes que ela escolhia e retirava para si os pontos mais cândidos, para depois tornar ao repouso em cima do seu muro convicta de que havia muito daquelas estrelas no seu interior. Não poucas vezes havia encontrado respostas lendo o céu estrelado. Percebeu quando desperta, já noite seguinte, que o céu escureceu demais, então abriu os bolsos iguais para libertar as luzes de volta para o firmamento, possibilitando assim a mescla entre o lúdico e o real. 
Com isso, entendera acerca da liberdade e do papel preenchido por cada um em tudo o que existe. Seus olhos brilhavam como as pedras celestes, que correspondiam com fachos de gratidão mais intensos quando assistidas pelos olhos da sua espectadora.


(Marco de Moraes)

sábado, 3 de dezembro de 2011

Desculpe se ofendi

Seria bem-vinda uma dose dupla de tranquilidade capaz de me convencer de que o que vejo lá fora é bom, é justo, porque na maioria dos meus longos dias (os recentes) o que vejo são tentativas alheias de encher o próprio copo, pouco se importando com o espaço do seu semelhante - ou com o que ele pensa. Egoístas ou não, pediria favor para entenderem o quão ruim é compartilhar da ignorância de outros pelo preço barato de um nada; ademais, é uma pechinca que dispenso, dou de ombros mesmo. Que a dose me seja generosa, talvez servida com gelo, porque árduo é perceber quando querem que engulamos discursos esfarrapados de que está tudo bem, quando ouvimos as suas promessas por melhores condições. O que me falta entender - e confesso, isso irrita - é ver que quem está embaixo ofende o seu semelhante, quando as ofensas que mais doem vêm de cima.


(Marco de Moraes)

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Sobre músico-poesia

Sou culpado confesso que percebe na música mais fragmentos de nós do que se possa imaginar. Música é terapia, bem como a poesia que versa o que somos, o que queremos expor de belo e de feio do nosso interior gritante mesmo que a sós o façamos. Comparo aqui o virtuosismo celere de instrumentistas com a escrita difícil de quem mostra a destreza - dotada de vazios - de quem conhece o que faz, embora falte cumplicidade no momento em que muito falam, mas nada dizem (não é assim que instrumentos e penas choram). Ter olhos para observar o dia-a-dia é essencial, mas o quão importante se faz um som marcante para o primeiro passo desejoso pela chegada de um dia promissor e o último passo para o adeus de um dia que se foi tarde. Nestas últimas linhas - espero não errar - ainda cabe perguntar como se acham dignas de respeito pessoas que dedicam seu tempo por chamar a atenção para mostrar o quão ocas são.


(Marco de Moraes) 

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Respire, aspire a, viva!

Mesclar a realidade com sonhos, quando na medida certa, é um dos caminhos para se ter uma vida mais feliz.
(Marco de Moraes)

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

No fim, só um ponto


Não, não é isso, mas é sim um verso diverso pela intenção intumescida de um papel há muito esquecido sob a pele empoeirada (bastante áspera, pois) de um móvel antigo que foi cuidado com a dedicação comedida por um tempo que passou vagaroso ante olhos exprimidos entre as frestas das portas pelas quais via-se, no fim, o desejo do alcance do ponto no qual você se encontrava.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Quintessência


Com o seu verde singelo de movimentos calmos separava o punhado de terra onde foi semeada pelo bico inocente daquele que batia asas de volta para casa. Criança de caule frágil, regozijava o bom da vida antes de as folhas surgirem para minúsculas sombras formar para transeuntes menores. A dança da vida deveras complicada para muitos tinha a força da pureza distante da tristeza, exposta ao calor ensolarado, ao frescor noturno sereno, ao rigor resfriado, à luz do poente ameno. O mundo à sua volta lhe era tudo ao passo que não se importava com nada, vivia. Quando à flor da idade, distribuía esperanças de vida a flor aberta em pétalas por espalhar ínfimas essências ao ar. Lembre-se: quanto mais perto, mais entendedor de mínimos manifestos de vida dentro de todo o nosso redor. Antes de indagações, a essência de tudo pode dar sentido a respostas para as perguntas mais complicadas.

(Marco de Moraes)

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Desmedido


Quanto medo e restrição impõem à vida de quem não se aventura os acanhamentos que, não porventura, abafam as chances de traduzir o desejos mais profundos em atitudes? A medida do tempo é objetiva, todavia cabe à nossa coragem fazer dela subjetiva, tal qual oportuna, nas linhas da intimidade entre os irmãos tempo e espaço. Longas distâncias podem ser percorridas, já os dias pomos guardados nas semanas, dentro de meses e anos. O primeiro dia é alívio, o segundo é perfeito, o terceiro se mescla na despedida e na vontade por voltar ao primeiro. O tempo pode ser de um dia ou mais, contudo o sentimos como se fossem apenas segundos ao lado de quem amamos.


(Marco de Moraes)

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Às meninices matutinas

Entregue a devaneios bambos senti o cheiro ingênuo da infância remetido às lembranças dos azulejos marrons – não mais fabricados – presos às paredes do corredor que antecedia o quintal da frente, acesso às estripulias descalças com pequeninas carambolas de vidro entre os dedos das mãos e uma bola de borracha dura conduzida por pés cobertos terra. Não poucas foram as manhãs que corriam ligeiras tais quais os inúmeros piques de nome inventado. Nossos dias passaram perante os olhos distraídos, sem doer, deixando pistas para histórias nas marcas de machucados há muito fechados e que nos lembramos risonhos ao tocá-los. Por vezes, a nostalgia é um aperto leviano no peito, um pano morno sobre as dores sentidas perante o dia-a-dia em um mundo rude e desigual.


(Marco de Moraes) 

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Uivos sós

Era um instante noturno no largo quintal em que duas mãos ardidas abusavam de maus tratos contra um amigo acossado por uma briga. Os uivos do cão largado ao relento eram efeito do lamento do seu dono relapso, em pleno abandono de uma solidão cativa e convencida nos pés frouxos pela falta de saber ceder. A insensatez que o dono apreciava silenciava cada tentativa de vã filosofia, sua falta de razão nua defendida a esmo com todo o quê de orgulho que mantinha, mesmo debilitado por si só. Não bastasse ser condenado à solidão que ele provocou, não buscou meios para abrandar as olheiras que aceitou havia muito, maltratando então o último (e também primeiro) companheiro cujo rabo posto entre as pernas denunciava não só o medo da sua necessidade de atenção, porém expunha também a carência que o seu dono sentia naquele quintal vazio.


(Marco de Moraes)

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Desde que verdadeiro

Negar que haverá amanhã não passa de uma covardia, ao passo que o abandono de sonhos faz de você tão ou mais impotente do que quem está ao seu lado à espera de um fim semelhante (ser feliz). Trata-se do mesmo dizer que tapar os ouvidos é um sinal de ignorância, enquanto tapar os olhos é uma morte anunciada, porque esconder-se no escuro e abster-se do gozo da vida perante equívocos cometidos não faz de você merecedor de melhores sortes que ninguém. Uma péssima sensação deve ser a desistência perante a conclusão tão vã quanto imprópria de que nada se pode fazer para afastar males. O desejo sincero não é um pecado, é a chance de tornar palavra, e assim verbo, a beleza que se tem dentro de si.


(Marco de Moraes) 

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Brado desinibido

Grite, não hesite, deixe a reclusão e vença o silêncio em busca de uma resposta, um intuito, um exagero capaz de quebrar os limites de um acaso munido de grossa timidez. Seja livre de censura, da culpa que não lhe serve, do amargo embaraço inconveniente por inibir os seus sentidos dentro daquilo que tanto está preso na sua angústia por dizer. Alcance a liberdade e atravesse a própria capacidade com a destreza de quem separa o que tem mérito e o que é vulgar. Grite, mas faça alto para que você ouça, reflita e entenda, pois se a sua voz nada diz à sua alma, não espere que outrem o faça por você.


(Marco de Moraes) 

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Pensares insones

Muitos pensamentos à toa vieram à tona ao conhecer quem me dissesse, sem medidas acanhadas, que palavras apanhadas antes de acostar-se devem ser derramadas no papel (nosso pensar vem repentino e se vai feito moleque em um pique no desatino divertido que, assim entendi, é intencional). Numa brincadeira de muitos convidados, a seriedade da rotina seria como um ponto de vista, subjetiva, e o interpretar diário árduo seria uma piada de mau gosto em que só um lado ri, no passar de malandragens esvoaçadas, tolas. Vai-se o céu claro de todo dia e chegam os brilhos pequeninos espalhados no véu escuro sob o qual uns dormem, enquanto outros se intrigam ao lê-los pela travessia do tempo, entendendo a ordem dos dias, os bons e os ruins. Tenho o pincel à mão, embora tintas não saiba misturar para a tela cobrir; tenho a caneta pronta e então escorro palavras, tatuando ao bel-prazer os pensamentos. Torço para que a falta de jeito com o pincel permaneça, tal qual a intimidade com a caneta cheia me faça borrar papeis ingênuos e que a vivência possa dizer o que entendo de mim, do mundo e dos arredores. A falta de sono se dá pela vontade de viver.


(Marco de Moraes) 

quinta-feira, 31 de março de 2011

Um quarto de violeta

Era um quarto de Violeta, de uma Violeta ao chão em cacos dispersos nos seus cantos chochos, sem timbre, aqueles pequenos quatro cantos fugidios; seus cantos e os outros cantos eram ecos vazios.
Sua lamúria era dó, enquanto seus sussurros davam ré, rentes às janelas entreabertas, convites para se estar só. Àquelas janelas perpetuavam delicadas cortinas alvas, salvas de antemão da mão a erguer uma flor despetalada.
Em quantos espinhos se feriu, pois que teimosa como uma rosa rodeou com dedos delgados a haste pontiaguda da flor?
Era do seu contragosto, todavia de bom grado: o trinco cego da porta foi retirado, a chave foi sem delonga partida e o mundo de fora não mais serviria assim que as janelas do quarto se fechassem para calar o ranger. O adeus de um amor murcho fez da Violeta muda e desditosa em um princípio desconhecido, vencido por ela,  derrotado para ela, vez que bastaria entender como ser sua antes de ser de outrem (não é nas mudas que brotam vidas também?).
Sua lamúria perdurou sendo dó até seus olhos, cheios, adormecerem no assoalho amadeirado, antes de chegar ao sol.
- Então isso é uma escala – ela confessou às paredes.
Era um quarto de violeta, mas poderia ser um terço, ou metade.



(Marco de Moraes)

segunda-feira, 21 de março de 2011

Afável chuvisqueiro

Era plena tarde quando assistia
A chuva fina, que fresca caía
E o pássaro repouso num fio
Com asas silentes, úmido assobio

A vista, à rua estreita em saltos incertos
Acima de blocos infindos, nos muros desertos
De onde nascia uma vida, botão pequeno
Em meio ao clima deveras ameno
Em que eu, observador entre pálida grade
Pasmava ante a riqueza daquela simplicidade.


(Marco de Moraes) 

quinta-feira, 10 de março de 2011

Fantasia à rotina

... e cantarolamos sem pejo, confiando nossos corpos nas chances foliãs cantadas, marcadas por apitos embriagados entre inúmeros sorrisos que guardei comigo (enquanto saltitante contigo) por aquelas ruelas sem nome.
Foi naquele bloco irrequieto que abafei a tristeza como quem cala a incerteza com o rufar dos tambores, junto das melodias nos sopros de metal banhado.
Fomos marchas, fomos escarnes, fomos o esquecimento ingênuo da rotina. Agora, somos uma quarta acinzentada, esperança do próximo bloco, a próxima fantasia.


(Marco de Moraes) 

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Abaixo dos próprios vazios

Eles têm boca, porém seus cigarros são falsos (logo os deles, sorrisos plastificados); eles mantêm os olhos bem abertos, todavia centrados em obviedades de fundos vãos; eles têm onde pôr chapéus, mas ideias, não; em verdade, eles são castrados, pois nada criam; eles fingem, e você acredita, por quê? O mundo está vazio de novo, posto que cheio de repetições. Não de hoje, já percebia “olha, eu sei fazer” em cada via na qual via um alguém intento a ter um tanto, mesmo o mínimo, da minha atenção e da sua também. Você bateu palmas? Assobiou? Vibrou? Eu evitei. Há de se entender sobre necessidades – aparecer, ter, ganhar, perder –, mas o meio de fuga visto hoje é infundado, é abusivo... Elas cantam a esmo, há muito fazem o mesmo (tão similares!) e se imitam a atrair quem possa ver-lhes com bons olhos. Deve ser a falta de ego, ou o excesso, que impele ocos se manifestarem, embora nada tenham a dizer. As frases são prontas; os corpos, refeitos; as roupas e os cabelos, nada mais que efeitos; são estilos trajados sem fios descentes, conquanto convincentes de que elas (pessoas) são mais que qualquer um. Elas estão abaixo dos próprios vazios e não há intrépidos suficientes para descobrir o véu turvo que lhes preserva a imagem. A imagem é a primeira vista, uma promessa imergida, uma linha inibida e incerta de gente esperta que fala só o que se quer ouvir, não o necessário. Eu me cansei, sentei-me há tempos e me silenciei assim que as cortinas e as luzes se fecharam. Mas e os outros, por que ainda aplaudem de olhos tapados?


(Marco de Moraes) 

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Cabelos

... com as pontas dos dedos provei da tua pele fina e, desejoso, atestei o quão bom é o conforto dos teus lábios, vez sem par na qual quis o tempo parar, mas ele foi desobediente e pôs-se a continuar, deixando na lembrança a música e palavras sussurradas nos ouvidos abaixo dos fios de cabelo. Teus olhos amenos eram pequenos no escuro onde pouco se via um ramo com pétalas lilases...


(Marco de Moraes) 

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Passado em pautas

Tentei forçar não ser (eu, que escondi os meus anseios por pura vergonha, orgulho omisso para não margear a tristeza, não ser fraqueza desonesta, inacabada, conjugada em verbo indefinido nas pautas cujo fundo branco amassei, rasguei em pedaços, mas guardei no meu bolso com zelo inexplicável. Tapeei-nos - a nós dois - cobrindo o rosto com as mãos, mas o enquanto tanto demorou, que nos ditanciou e de longe pouco ouvia a sua voz quando eu mesmo precisei. Fui impreciso e fui, de improviso, gritando reclames com os azuis do céu que se desmancharam em borrões, deixando-me sozinho; na verdade, faltaram-me direções para apontar, arrimos para suavizar o peso, ar para ser; o saber me faltou. O que passou não me foi passado por ninguém, portanto, desavisado, incomodei o quanto pude e, rude, pedi silêncio para compreender quando me preocupei com um som que servisse para trepidar o vidro tênue, mesmo resistente, que construí para separar um mundo – o nosso mundo – em dois com robustez tamanha que nenhuma outra artimanha me ocorreu (percebi que tu não enxergavas nada antes do zero). Minhas horas em vigília foram expostas pelas profundas olheiras cuja cura limitou-se no passado de num quintal morto e vazio, paradoxo no qual fluíam pensares sobre o quão óbvia pode ser a entrega da alma – intrínseca – aos cuidados alheios e compreender o que são sopros, manifestações de vida, além de entender a essência de o que são vontades. Pude enterrar com mãos nuas aquele presente cavando fundo em terras tristonhas ao passo que o suor suavizava meu corpo indecente, ainda que puro, no instante nada casual de uma decisão), porém esvaziei os bolsos daquele branco amargo, a fim de que pudéssemos sorrir com mais naturalidade. Eu, aqui; tu, não sei onde.


(Marco de Moraes) 

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Puras juras

Passou mais um mês
e tu esqueceste de vez
quem foi que fez
a insensatez
ser sentida, ingênua a vagar.

Vem com candura,
traz a cura pura
e jura
(mas jura?),
jura que hoje vais me encontrar.

A virtude antes descrida,
inibida
foi concedida,
(então percebida)
àquele que jamais se faz calar.

É preciso ir,
deixar de cair,
o corpo erigir
e, assim que sair,
lembrar-se qual o meu nome
e me chamar.


(Marco de Moraes) 

sábado, 22 de janeiro de 2011

Selos

Olá! Hoje estou postando aqui selos que recebi da Akira e da Rafalla B.! Fiquei muito feliz e contente por ter recebido os selos das duas, que me são queridas!

Beijos e abraços!





Nome: Marco Antonio Rocha de Moraes.
Uma música: Conversa de botequim (Noel Rosa)
Humor: na paz.
Uma cor: Vermelho.
Uma estação: Outono.
Como prefere viajar: de carro.
Um seriado: Friends.
Frase ou palavra mais dita por mim: porraaaaa!
O que achou do selo: eu gostei, oras!

Blogs indicados:

open diary - Kerol Ainne
gambiarra - Beto Borati
catras sobre a mesa - Rafaella B.
a toca - akira
a arte de um sorriso - rodolpho padovani
pensamentos não ditos - TM
mundo pequeno - Diego Cara
poemas miúdos - Ana Beatriz
flaws and all - Gessy
idéias, poemas e risadas - Jota Marques

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Adeus, ano ordinário

Por fim pude me despedir de um ano arrastado e birrento que não me foi muito cortês. Já era sem tempo, como não? Vez não faltou no ano que jaz para que eu, ofegante, lamentasse por tão pouco ter chance para repousos que convencessem meu corpo de que era hora de fechar os olhos trêmulos um tanto, sem contratempos maiores a me preocupar porque ou eu passava do compasso ou me atrasava. Eram pormenores, os pormenores... Meus palpites sujos e infelizes foram objetos de desdéns de dias-a-dia pilantras cuja realidade era indigesta, mas que por sorte geraram motivos para honrarias ricas resultantes de bons dizeres escritos. Disto me poupo da insatisfação, até me permito evitar: palavras brotaram no terreno interior tido como infértil e acusado como parco, quando em verdade era tímido – houve quem não entendesse ou se fizesse desentendido, bem sei – e se mostrava reflexivo, retraído até se entregar à irresistível brancura do papel e às oportunidades que só as vontades por liberdade proporcionam, digo ainda que muito saborosos foram os frutos regados de nanquim! Houve momentos de plena escuridão matinal em que vozes ecoavam baixo amiúde, dispersando os sentidos com fins de blefe embolados sendo que pouco restou para me enganar enquanto era convocado a trilhar desconfiado pelas sombras ouvindo sussurros sedutores incansáveis. Meras induções a erros. Decerto foi o tipo de engano torvo que tive de conviver, assim como o desgosto pelo fel deveras sensaborão que me alertava por eu ser o ofensor da tristeza agredido por todos os recantos em surras estúpidas, rígidas e necessárias por que deveria passar. Fiz-me solitário a vislumbrar os encantos do céu em presentes raros que reconheci merecedores de atenção porque dúvidas não faltaram: foi um ano de reclusões merecidas às quais reflexões da vida me fizeram enxergar o antes impossível. Cabe aqui um despedir que estava entalado, demasiado voluntário: adeus, dias doloridos de um ano ordinário.

(Marco de Moraes)