quinta-feira, 31 de março de 2011

Um quarto de violeta

Era um quarto de Violeta, de uma Violeta ao chão em cacos dispersos nos seus cantos chochos, sem timbre, aqueles pequenos quatro cantos fugidios; seus cantos e os outros cantos eram ecos vazios.
Sua lamúria era dó, enquanto seus sussurros davam ré, rentes às janelas entreabertas, convites para se estar só. Àquelas janelas perpetuavam delicadas cortinas alvas, salvas de antemão da mão a erguer uma flor despetalada.
Em quantos espinhos se feriu, pois que teimosa como uma rosa rodeou com dedos delgados a haste pontiaguda da flor?
Era do seu contragosto, todavia de bom grado: o trinco cego da porta foi retirado, a chave foi sem delonga partida e o mundo de fora não mais serviria assim que as janelas do quarto se fechassem para calar o ranger. O adeus de um amor murcho fez da Violeta muda e desditosa em um princípio desconhecido, vencido por ela,  derrotado para ela, vez que bastaria entender como ser sua antes de ser de outrem (não é nas mudas que brotam vidas também?).
Sua lamúria perdurou sendo dó até seus olhos, cheios, adormecerem no assoalho amadeirado, antes de chegar ao sol.
- Então isso é uma escala – ela confessou às paredes.
Era um quarto de violeta, mas poderia ser um terço, ou metade.



(Marco de Moraes)

segunda-feira, 21 de março de 2011

Afável chuvisqueiro

Era plena tarde quando assistia
A chuva fina, que fresca caía
E o pássaro repouso num fio
Com asas silentes, úmido assobio

A vista, à rua estreita em saltos incertos
Acima de blocos infindos, nos muros desertos
De onde nascia uma vida, botão pequeno
Em meio ao clima deveras ameno
Em que eu, observador entre pálida grade
Pasmava ante a riqueza daquela simplicidade.


(Marco de Moraes) 

quinta-feira, 10 de março de 2011

Fantasia à rotina

... e cantarolamos sem pejo, confiando nossos corpos nas chances foliãs cantadas, marcadas por apitos embriagados entre inúmeros sorrisos que guardei comigo (enquanto saltitante contigo) por aquelas ruelas sem nome.
Foi naquele bloco irrequieto que abafei a tristeza como quem cala a incerteza com o rufar dos tambores, junto das melodias nos sopros de metal banhado.
Fomos marchas, fomos escarnes, fomos o esquecimento ingênuo da rotina. Agora, somos uma quarta acinzentada, esperança do próximo bloco, a próxima fantasia.


(Marco de Moraes)