segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Abaixo dos próprios vazios

Eles têm boca, porém seus cigarros são falsos (logo os deles, sorrisos plastificados); eles mantêm os olhos bem abertos, todavia centrados em obviedades de fundos vãos; eles têm onde pôr chapéus, mas ideias, não; em verdade, eles são castrados, pois nada criam; eles fingem, e você acredita, por quê? O mundo está vazio de novo, posto que cheio de repetições. Não de hoje, já percebia “olha, eu sei fazer” em cada via na qual via um alguém intento a ter um tanto, mesmo o mínimo, da minha atenção e da sua também. Você bateu palmas? Assobiou? Vibrou? Eu evitei. Há de se entender sobre necessidades – aparecer, ter, ganhar, perder –, mas o meio de fuga visto hoje é infundado, é abusivo... Elas cantam a esmo, há muito fazem o mesmo (tão similares!) e se imitam a atrair quem possa ver-lhes com bons olhos. Deve ser a falta de ego, ou o excesso, que impele ocos se manifestarem, embora nada tenham a dizer. As frases são prontas; os corpos, refeitos; as roupas e os cabelos, nada mais que efeitos; são estilos trajados sem fios descentes, conquanto convincentes de que elas (pessoas) são mais que qualquer um. Elas estão abaixo dos próprios vazios e não há intrépidos suficientes para descobrir o véu turvo que lhes preserva a imagem. A imagem é a primeira vista, uma promessa imergida, uma linha inibida e incerta de gente esperta que fala só o que se quer ouvir, não o necessário. Eu me cansei, sentei-me há tempos e me silenciei assim que as cortinas e as luzes se fecharam. Mas e os outros, por que ainda aplaudem de olhos tapados?


(Marco de Moraes) 

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Cabelos

... com as pontas dos dedos provei da tua pele fina e, desejoso, atestei o quão bom é o conforto dos teus lábios, vez sem par na qual quis o tempo parar, mas ele foi desobediente e pôs-se a continuar, deixando na lembrança a música e palavras sussurradas nos ouvidos abaixo dos fios de cabelo. Teus olhos amenos eram pequenos no escuro onde pouco se via um ramo com pétalas lilases...


(Marco de Moraes) 

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Passado em pautas

Tentei forçar não ser (eu, que escondi os meus anseios por pura vergonha, orgulho omisso para não margear a tristeza, não ser fraqueza desonesta, inacabada, conjugada em verbo indefinido nas pautas cujo fundo branco amassei, rasguei em pedaços, mas guardei no meu bolso com zelo inexplicável. Tapeei-nos - a nós dois - cobrindo o rosto com as mãos, mas o enquanto tanto demorou, que nos ditanciou e de longe pouco ouvia a sua voz quando eu mesmo precisei. Fui impreciso e fui, de improviso, gritando reclames com os azuis do céu que se desmancharam em borrões, deixando-me sozinho; na verdade, faltaram-me direções para apontar, arrimos para suavizar o peso, ar para ser; o saber me faltou. O que passou não me foi passado por ninguém, portanto, desavisado, incomodei o quanto pude e, rude, pedi silêncio para compreender quando me preocupei com um som que servisse para trepidar o vidro tênue, mesmo resistente, que construí para separar um mundo – o nosso mundo – em dois com robustez tamanha que nenhuma outra artimanha me ocorreu (percebi que tu não enxergavas nada antes do zero). Minhas horas em vigília foram expostas pelas profundas olheiras cuja cura limitou-se no passado de num quintal morto e vazio, paradoxo no qual fluíam pensares sobre o quão óbvia pode ser a entrega da alma – intrínseca – aos cuidados alheios e compreender o que são sopros, manifestações de vida, além de entender a essência de o que são vontades. Pude enterrar com mãos nuas aquele presente cavando fundo em terras tristonhas ao passo que o suor suavizava meu corpo indecente, ainda que puro, no instante nada casual de uma decisão), porém esvaziei os bolsos daquele branco amargo, a fim de que pudéssemos sorrir com mais naturalidade. Eu, aqui; tu, não sei onde.


(Marco de Moraes)