sexta-feira, 17 de junho de 2011

Uivos sós

Era um instante noturno no largo quintal em que duas mãos ardidas abusavam de maus tratos contra um amigo acossado por uma briga. Os uivos do cão largado ao relento eram efeito do lamento do seu dono relapso, em pleno abandono de uma solidão cativa e convencida nos pés frouxos pela falta de saber ceder. A insensatez que o dono apreciava silenciava cada tentativa de vã filosofia, sua falta de razão nua defendida a esmo com todo o quê de orgulho que mantinha, mesmo debilitado por si só. Não bastasse ser condenado à solidão que ele provocou, não buscou meios para abrandar as olheiras que aceitou havia muito, maltratando então o último (e também primeiro) companheiro cujo rabo posto entre as pernas denunciava não só o medo da sua necessidade de atenção, porém expunha também a carência que o seu dono sentia naquele quintal vazio.


(Marco de Moraes)