segunda-feira, 30 de julho de 2012

Até breve, Inácio

É muito sem jeito que escrevo esse monte de garrancho num pedaço de papel queimado pelo sol que nos aperreia desde sempre. Sei que o senhor não sabe ler, mas a irmã aprendeu direito na escolinha, então ela pode fazer isso com gosto.
Eu vou, mas não se chateie, não, quem decidiu ir fui eu. Aviso que vou tentar ganhar o que comer nas terras de longe, bem longe, porque aqui a miséria aperta a barriga até doer e nesta terra nada mais dá, eu já tentei. Aqui o chão de barro rachado é tão seco que até o Damião, aquele calango que eu criava, morreu, mas escondi o corpo dele na sombra do mandacaru atrás de casa.
Levo na cintura a moringa de couro sem água, o chapéu furado na cabeça, a peixeira cega na bainha, e nas costas carrego o violão com as três cordas que restaram; lá, ré, mi... a última que se arrebentou me ensinaram, mas eu esqueci. A vontade fez que nem a rima de sanfona no peito, veio me tirar a secura de garganta com as lembranças do cheiro de cajá roubado na feira da cidade, sempre lambuzando a boca quando mordia.
Eu vou, mas prometo que volto estudado, de roupa limpa e cabelo penteado, pois quero ser doutor. O senhor me obrigou a ler e escrever, agradeço muito por isso. Mais uma vez digo que não é nada com o senhor, nem com a mãe ou a irmã, coitada, é com a chance de viver diferente. Eu sabia desde menino que eu podia ter o que quisesse, que é só ter vontade; vou aos dezoito, mas volto aos trinta e três, quero ter tentar uma vida de certeza para deixar estes dias de talvez.

(Marco de Moraes)

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Retórica

Vá lá entender... Quando bem quer, o homem machuca; no tempo em que é ferido, retruca.


(Marco de Moraes)