segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Versibus

Quantos versos cabem num universo?

E no seu?

sábado, 15 de dezembro de 2012

Visões de mundo

Do exterior, enxergamos
todo um mundo
ou parte.
Do interior disso, pensamos
e do fundo
trazemos arte.

Entenda os movimentos
das linhas que nem medi.
O que existe são expressões
bem como as contruções
cujas poesias são ornamentos
sobre todas as coisas em si.


(Marco de Moraes)

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Tino

Quanto se pode apreciar a chegada a um final, seja vitorioso ou derrotado, sem que haja vivência no meio?

Lute,
aprenda,
viva.

(Marco de Moraes)

sábado, 13 de outubro de 2012

sábado, 15 de setembro de 2012

Diferentes maneiras

Eles chegaram, venha ver! Se não percebeu quem são, faço logo saber: os passos do homem de fraque e cartola escuros deslizam pela nossa rua irregular como fazem as gotas da chuva que caem desde o início desta tarde entediada. Elas vêm modestas com sopro do vento, enquanto ele se queixa da lama entre as pedras em que a sola pisa, isso quando não xinga sozinho; tão jovem e tão ranzinza... Qualquer cuidado ali é bastante, questão de escolher as pedras certas no decorrer do caminho! Bom, a pressa do homem tem lá sua razão, pois da carruagem à frente do portão cabem mais de cem passos, assim como os mil pensamentos acerca do convívio com aquela a quem fez promessas de bons confortos. Como sei? Já prestei vários serviços ao homem e posso dizer que o hábito dos seus elogios veste (e santifica) a moça muito melhor que qualquer dos seus vestidos finos feitos sob medida. Em todos os lugares é assim: ele sai antes para ver se tudo está bem, volta e oferta apoio às mãos delicadas da moça, que sorri. Difícil entender? Nem tanto. Muitos foram os pretendentes, mas aquele ali foi o preferido. Entenda, ele não tem bolsos recheados, ele não é dos mais belos e ainda é desastrado, todavia a diferença entre ele e os outros está no quanto ele é bom, no reconhecer de valor que é dos seus tratos.

(Marco de Moraes)

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Até breve, Inácio

É muito sem jeito que escrevo esse monte de garrancho num pedaço de papel queimado pelo sol que nos aperreia desde sempre. Sei que o senhor não sabe ler, mas a irmã aprendeu direito na escolinha, então ela pode fazer isso com gosto.
Eu vou, mas não se chateie, não, quem decidiu ir fui eu. Aviso que vou tentar ganhar o que comer nas terras de longe, bem longe, porque aqui a miséria aperta a barriga até doer e nesta terra nada mais dá, eu já tentei. Aqui o chão de barro rachado é tão seco que até o Damião, aquele calango que eu criava, morreu, mas escondi o corpo dele na sombra do mandacaru atrás de casa.
Levo na cintura a moringa de couro sem água, o chapéu furado na cabeça, a peixeira cega na bainha, e nas costas carrego o violão com as três cordas que restaram; lá, ré, mi... a última que se arrebentou me ensinaram, mas eu esqueci. A vontade fez que nem a rima de sanfona no peito, veio me tirar a secura de garganta com as lembranças do cheiro de cajá roubado na feira da cidade, sempre lambuzando a boca quando mordia.
Eu vou, mas prometo que volto estudado, de roupa limpa e cabelo penteado, pois quero ser doutor. O senhor me obrigou a ler e escrever, agradeço muito por isso. Mais uma vez digo que não é nada com o senhor, nem com a mãe ou a irmã, coitada, é com a chance de viver diferente. Eu sabia desde menino que eu podia ter o que quisesse, que é só ter vontade; vou aos dezoito, mas volto aos trinta e três, quero ter tentar uma vida de certeza para deixar estes dias de talvez.

(Marco de Moraes)

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Retórica

Vá lá entender... Quando bem quer, o homem machuca; no tempo em que é ferido, retruca.


(Marco de Moraes)

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Soluções


Dilemas formavam-se dando azo
aos temas caídos uns sobre outros.
As rimas apinhavam-se, não acaso;
mas e os temas, eram sobre o quê?
Fazia falta velar,
cobrir o sofrer com ternura.
Faltou ser brando, mesmo que bambo,
acalmar as faltas dos porquês.
Dias estranhos se estendiam
até os descansos irrequietos.
Cativo efeito no tempo disperso,
ainda que necessário à razão. 
Quiçá intimidando a ordem das coisas
encontraria as respostas, enfim.
E se eu fosse além,
além,
isolaria as agonias,
seria um arteiro,
guardaria todas elas num envelope pequeno
debaixo do meu travesseiro.


(Marco de Moraes)

sábado, 28 de abril de 2012

Rotina

Nomeou incômodas as sensações de fadiga, manifestando com sorriso singelo a alegria do encaixar de chave na fechadura ao chegar em casa tão tarde. Como a palavra perfeita havia fugido, aceitou se considerar "morta".

O capacho chiava, o trinco se retirava, ela coloria a sala dando vida ao lustre pendente no teto enquanto acessava a entrada roçando os calcanhares para retirar os calçados. Aquilo era tão bom para aliviar calos doloridos! Os sapatos caíam deixados de qualquer jeito sobre o tapete onde correspondências persistiam intocadas desde a tarde anterior.

Contas, quantas contas...

Seu corpo retrucava com estalos quando se espreguiçava, e estapear as roupas certamente a livraria das mazelas daquele dia que, de tão cheio, tinha parado apenas para engolir o lanche sem tempo para trocado entre os trabalhos.

Àquela altura, preparar café e sentir seu odor amenizaria os ânimos, assim como esquentar pão com manteiga a reanimaria para um banho quente antes de se deitar. Pertinaz, não se fazia vítima da rotina pesada porque, no fundo, sonhava com o aguardado dia em que as mudanças há tanto planejadas finalmente aconteceriam graças à dedicação nas telas em que pincelava suas doses de alma nas horas vagas.

Ela queria bem, queria mais, mas sabia não ser pedir demais viver daquilo que tanto se gosta.

(Marco de Moraes)

quinta-feira, 22 de março de 2012

Apenas seja

Se é comum podermos realizar desejos sinceros enquanto sonhamos, então somos capazes de fazer da realidade um sonho bom quando nos tornamos fieis às nossas verdadeiras vontades.


(Marco de Moraes)

sábado, 3 de março de 2012

Destro João

João, morador de vila erma sem limites ou portão, despertava todos os dias antes de o galo magrelo do vizinho anunciar o raiar matinal. Seus olhos eram os primeiros da casa dispostos a enxergar as telhas tortas acima da cama velha assim que acendia o lampião que conduzia às madeiras bambas postas no meio da salinha – único cômodo, também quarto e cozinha – que serviam de apoio no qual desjejuava cafés-da-manhã sem café enquanto iniciava as leituras diárias mastigando pão velho e roendo rapadura, tudo com a ajuda de um copo d’água. As migalhas caíam aos pés ao passo que as letras eram sorvidas com o prazer de tempo restrito, pois que a labuta pesada impedia a dedicação ao gozo da leitura e seu pai cria ser o livro grande perda de um precioso tempo de labor – muitos os trabalhos; miúdos os ganhos – para o que comer no sertão. João lia as linhas centrado em cada palavra e virava páginas de Vidas Secas com a mão canhota, a solitária, já que perdera a direita trabalhando num canavial (uma pena,  vez que era destro). Persistir nas leituras resultou na vontade de escrever, então reproduzia cada página, às escondidas e de pouco em pouco, com um pedaço fino de carvão nos papeis de pão, até a madrugada em que decidiu partir da vida na caatinga para ser escritor, deixando promessa profunda de retorno na caligrafia feia do bilhete de cantos rasgados para o pai ranzinza. Acredite, deseje, pois há de superar adversidades em busca daquilo que se quer.


(Marco de Moraes)

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

O “supérfulo” não existe

É em meio aos corres-corres pelas ruas do cotidiano que pés afoitos atravessam de um lado a outro em busca de objetivos dos mais distantes daqueles que são os verdadeiros desejos que tanto se anseia alcançar. Quiçá o problema esteja na falta de saber separar o que se quer e o que se precisa, sendo as queixas uma questão de oportunidade dos muitos insatisfeitos do modo de viver. Todos culpamos os dias curtos pelos comuns “quem sabe um dia, hoje não...”, pois carecemos de desfrutes tão simples como: o passar de brisa no rosto, a lembrança de uma piada engraçada, o gosto de café bem feito. Poucos miram os olhos de outrem, poucos agradecem um favor, poucos os que sequer observam às quantas anda o próprio humor, propício a furor descabido. Foi numa tarde de pressa rotineira que ouvi os assobios do violino tocado pelas mãos humildes de um pedinte numa calçada onde inúmeros passos impacientes não dedicavam uma ínfima fatia do seu dia para apreciar Música Clássica entre tantas vozes desafinadas e berros de buzinas. Incrível é observar como somos vítimas de um ciclo do qual se torna difícil sair, vivemos em dias de uma sociedade que se distancia do que é apreciável e se aproxima do que é supérfluo, porque este sim, além de existir, faz-se presente em todos dias que cada vez menos sentimos passar.


(Marco de Moraes)