domingo, 17 de outubro de 2010

O despertar do desejo oculto

A luz amarelada titubeava tentando acompanhar a dança da brisa que adentrava rodopiando na ponta dos pés entre as grades da tímida janela aberta enquanto o meu passo imoto ditava o ritmo e media o andamento de um silêncio infame que condizia com a escuridão a me rodear e me tentar a ser mais um, apenas mais um, imerso no denso breu onde todos esqueciam tudo, até o óbvio, e de lá eu podia enxergar as sombras recostadas nas paredes se recobrando das fadigas que lhes acometiam naquela sala. Sozinho? Não. O frio presente me forçava a envolver-me e aconchegar-me no meu abraço carente de afeto e perdido de saudade por tempos de cujos sorrisos me recordava vagamente, pois refletir sobre a vida ante uma pequena vela acesa que chiava por ter seu corpo esbranquiçado consumido pelo tempo e sendo o seu fim assistido por um alguém que nada podia fazer era algo raro e devaneante. Assim que a escuridão contagiou o cair da noite, tateei pelas várias gavetas velhas – elas rangiam de tão roucas, você precisava ouvir – afoito procurando por ela, a vela pequenina que me traria a esperança e a certeza de que pode – e deve – nascer luz em meio ao umbral. Eu dei vida àquela chama e implorava para que o seu calor perdurasse consoante à teimosia de uma paixão, até então inevitável, que a diminuía mesmo eu entregue ao anseio pela sua vida. Havia erro e eu o senti por vez intenso até perceber que me enganava ao sorver um enlevo que não me pertencia; olhei então para as sombras que descansavam no rodapé da parede, instante em que me doei ao tino. O vento parou, a chama parou, o frio também. Eu não. Perguntando ao meu íntimo encontrei a resposta abafando a chama com as mãos acreditando que conseguiríamos ser felizes. Tudo se encheu de calma e então pudemos nos banhar do fulgor lunar que atravessou pela janela e que amamos desde então.

3 comentários:

  1. Lindo meu caro. Nossa paixão pela rainha da noite... Converso com você sobre a Lua, vc vai se surpreender com o que te falarei...

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  2. Lindo demais, Marco.
    "O vento parou, a chama parou, o frio também. Eu não."

    Perfeito....
    É sempre um bálsamo ler tuas obras.
    Parabéns.
    Beijos.

    Carol Negrel

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