(Marco de Moraes)
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quinta-feira, 15 de agosto de 2013
Contragosto
Apesar de acontecer a contragosto, ser público de piadas infames é tão
comum que cai no consenso de maiorias como se nada de mais acontecesse.
Há quem duvide de tantas dívidas, há quem divida muitas dúvidas. Para
esclarecer, esta é uma homenagem para os doutos que nada sabem e ocupam
altos cargos, sem o menor propósito ou compromisso, sentados logo ao
lado dos entendidos que manipulam massas e escondem o que há de mau (e
pior) atrás dos mesmos sorrisos que conseguiram a confiança do seu voto
num domingo de outubro. Se este é um país sério, é curioso pensar em
como leis são criadas sem sentido e sentidos de ruas se modificam, sem
mais, quando é por bem menos que cidades são pavimentadas com mentiras
encobertas pelas promessas esquecidas no fundo de gavetas. Nos dias de
hoje, calar-se em meio a tantos males é engolir gritos presos já faz
muito tempo. Seja legal, faça com gosto, sinta-se bem; manifestar o pensamento é um ato
livre.
segunda-feira, 24 de junho de 2013
Várias e única (às Marias)
Calor de fogo no feijão, fundo no
barro da panela; colher de pau distraída na mão, os olhos firmes na
janela. Além de pulsos e suspiros inocentes antes do jantar, no
peito de Maria cabia a falta de Severo, seu homem, que desde ontem
saiu para trabalhar confortando um copo de café na barriga e um pão
enrolado em panos. Apesar de breves, suas despedidas tinham o encanto
do sabor de bem-querer, sempre após o galo cantar, um tanto antes de
o dia nascer, e faziam de Maria Moça
solitária desde as primeiras às últimas horas de cada dia.
Jovem quase pronta, ela tinha desejos de mulher, dona de feições meninas cujos sorrisos ante a fogueira na sala sossegavam os receios da promessa que fizera ao consorte: proteger o filho bebê sem jamais negar ninar, além de oferecer peito a cada choro pedinte e colo ao menor gemido no berço magrelo ao lado da cama.
Suor dele lá, esforço dela cá. Os afazeres eram muitos, as horas sem relógio pareciam uma. Maria Morena deixava cair os fios negros sobre o ombro que segurava o leve vestido florido enquanto espiava a porta da frente, além da janela e quintal, isso antes de varrer todo o chão de tal sorte a enxotar o pó e as incertezas, antes mesmo de despir os pés para se ajoelhar e pedir em preces a Padre Cícero que nunca faltasse um grão sequer em casa.
Flor difícil do sertão, Maria Sonhosa via muito no redor modesto, de poucos porquês, morada em que habitava a certeza de que nacos de giz e uma louça rachada serviriam para educar um filho como ninguém mais seria capaz. Não à toa, o amor de Maria Mãe ia muito além de apenas dar à luz.
Jovem quase pronta, ela tinha desejos de mulher, dona de feições meninas cujos sorrisos ante a fogueira na sala sossegavam os receios da promessa que fizera ao consorte: proteger o filho bebê sem jamais negar ninar, além de oferecer peito a cada choro pedinte e colo ao menor gemido no berço magrelo ao lado da cama.
Suor dele lá, esforço dela cá. Os afazeres eram muitos, as horas sem relógio pareciam uma. Maria Morena deixava cair os fios negros sobre o ombro que segurava o leve vestido florido enquanto espiava a porta da frente, além da janela e quintal, isso antes de varrer todo o chão de tal sorte a enxotar o pó e as incertezas, antes mesmo de despir os pés para se ajoelhar e pedir em preces a Padre Cícero que nunca faltasse um grão sequer em casa.
Flor difícil do sertão, Maria Sonhosa via muito no redor modesto, de poucos porquês, morada em que habitava a certeza de que nacos de giz e uma louça rachada serviriam para educar um filho como ninguém mais seria capaz. Não à toa, o amor de Maria Mãe ia muito além de apenas dar à luz.
(Marco de Moraes)
quarta-feira, 8 de maio de 2013
Foi dia 23
A manhã já era
tarde, porém não demais para que o tempo tomasse as minhas chances
de estar bem. Levantar me custou um proveito que apenas a minha
preguiça sobre a cama quente saberia explicar naquele dia de março
em que decidi esquecer os ponteiros na escrevaninha revirada, aliás,
quis jogar fora qualquer bilhete de compromisso, pois reuniria as
pessoas que me querem o melhor para comemorarmos o dia, onde quisesse
que fosse. Salve! Propor pisar pelas ruas com as sandálias
calçadas foi questão de um estalo, então me atrevi a atravessar
junto de dois amigos para um bairro que havia muito não visitava. Se
a ida foi boa, a volta foi melhor. Como foi bom receber apertos de
mão e o abraço da chuva que limpou a alma como só ela faria...
Salve! Os convidados iam-se chegando, todos se ajeitando sem
reclames num espaço onde qualquer um duvidaria reunir tanta gente.
Lá couberam as piadas infames, coube quem comesse jujuba pela falta
do que fazer, coube a música alta e ainda coube uma voz que latia
sem razão, tudo misturado com a bebida dos risonhos, um tanto de sal
e limão. Salve! Um dia inteiro num segundo, história para
contar com brilhos nos olhos para quem quiser ouvir. A noite já era
tarde, contudo não demais para agradecer com as mãos para o céu ao
povo que esteve todo o tempo comigo e eu sei que eles nunca, nunca me
deixarão sozinho.
Em homenagem ao aniversário de um dos meus amigos do peito.
(Marco de Moraes)
sexta-feira, 29 de março de 2013
Bons frutos
O que sobrou foram as
sementes. Severo seria, além de um bom mentiroso, menino teimoso se espalhasse
para os quatro ventos que os frutos de acerola do quintal de casa eram coisas
bobas, nada de mais.
- Desce dessa árvore
agora! - não havia um dia sem berros vindos da sua mãe. Adultos eram chatos, então seguia as
vozes das crianças que só ele ouvia nas brincadeiras de menino solitário que
perdiam a hora encontrando mil desculpas para uma estória ou outra ter o final
feliz mordiscando daquelas pequenas.
Não havia ambições.
Como entender as
queixas do pai acerca dos males do mundo, se para sorrir bastavam acerolas?
Naqueles poucos metros de chão vivia uma família simples, de roça, que um dia
partiu para visitar um parente distante que adoeceu. Sem ter as passagens,
venderam a casa ao vizinho da frente por um mero trocado. Além disso,
confiariam o menino aos seus cuidados quando prometeram o retorno que nunca
aconteceu.
Severo era como o pai: pensava, fazia, então resolveu crescer por si
só, ser um bom cabra. Como viu a árvore ser derrubada pelo simples
desgosto do homem da casa, o menino partiu com saudade deveras chorosa. Antes
de ir de vez, arou com os dedos um bocado de terra perto da casa e ali cobriu duas
sementes...
Calos nas mãos, inchada; braços firmes, labuta; os pelos no rosto
eram vivência. Foi-se o tempo longe.
A saudade do passado bom o convenceu a
voltar.
Ao chegar, pôs o chapéu no peito, ficou um tanto sem jeito, silenciou.
Apesar de os poucos metros da sua infância estarem vazios, um pé de acerola
cresceu na terra que havia arado, pé em que uma mulher descansava recostada.
O rapaz se ajeitou sorrateiro no outro lado do tronco.
- Sabe, moço, essas frutas são boas, olhe aqui estas sementes!
Severo enfim entendeu que, mesmo em
tempos de mágoa, é possível colher bons frutos quando se planta amor.
sexta-feira, 1 de março de 2013
Percepções
Finda sombra, deixei os temores de lado para entender o
valor de um abraço distante.
Aqueles dias cinzas se foram, e assim me convenci de que
pisar descalço o chão também é possível após lições que às vezes não prestamos
atenção, mas que aprendemos com chegadas e despedidas; são condições.
Não vá agora. Pode ficar. Há companhias que fazem bem.
Sorrisos gratuitos atraem semelhantes, já caretas conquistam
solidão. Não raro vemos o mundo permanecer o mesmo, com o mesmo deboche e os
contras impostos antes das nossas insatisfações.
Mas o que fazer diante disso?
Os obstáculos vêm de fora ou as criamos? Há diferença ou dá
igual?
Um elogio pode soar ofensa de acordo com a inquietude do
espírito de quem ouve, por isso cabe a nós mesmos afastar as nuvens da
tempestade enquanto temos tempo.
Pode não parecer importante, mas é.
Acredite: não existe réu quando seu céu está
azul.
(Marco de Moraes)
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